domingo, 12 de maio de 2019

Introdução à Filosofia Medieval

A Filosofia Medieval surge com a Patrística, Filosofia dos padres da Igreja, no século II d.C., período em que há o declínio do Império Romano, e, ao mesmo tempo, a expansão do Cristianismo. Como a religião  cristã é uma religião essencialmente missionária, isto é, tem como propósito a cristianização, a pregação das Sagradas Escrituras, os clérigos criaram a Apologética, a saber, a apologia ao Cristianismo. 


Para tanto recorreram à Filosofia platônica e acabaram por produzir uma síntese entre a Filosofia platônica e a doutrina cristã. O principal nome da Patrística foi Santo Agostinho. Se utilizando da Filosofia Platônica, Santo Agostinho traça o seguinte paralelo: o mundo das ideias, exprime a perfeição e seria equivalente às ideias divinas, que exprimem a verdade; e o mundo sensível, cópia imperfeita do mundo inteligível e seria equivalente às ideias mundanas, que são as opiniões. 

Se, para Platão, o Sol ilumina a ideia de Bem, para Santo Agostinho, Deus ilumina as verdades eternas. Segundo a teoria de iluminação de Santo Agostinho, o homem recebe de Deus o conhecimento das verdades eternas: tal como o Sol, Deus ilumina a razão e torna possível o pensar correto. Neste ponto, podemos perguntar se qualquer homem terá a sua razão iluminada por Deus.

Certamente não, mas somente aquele que crê, que tem fé. Assim podemos entender a expressão agostiniana: “Credo ut intelligam (Creio para que possa entender).” Desse modo, a razão é considerada auxiliar da fé e a ela subordinada. Em suma, do século II ao século IX, a chamada Alta Idade Média, foi o período em que predominou a Patrística: os padres da Igreja retomavam a cultura antiga de modo a adequar o conhecimento até então produzido às verdades teológica. Do século X ao século XIV, a chamada Baixa Idade Média, temos a Escolástica: que é a Filosofia cristã propriamente dita, já que a Filosofia do período patrístico era a Filosofia denominada greco-romana, ou Filosofia da Antiguidade tardia.

De modo geral, podemos dizer que, apesar da razão ser considerada “serva da Teologia”, no século XI, com o renascimento urbano, surgem diversas universidades por toda a Europa. Nos debates filosóficos, a razão parece ganhar certa autonomia. Nesse momento, a Filosofia de Aristóteles, que antes era vista com desconfiança, tida como perigosa para a fé, é retomada por São Tomás de Aquino. Este, por sua vez, procura adaptar tal Filosofia à Escolástica, criando o que passou a ser conhecido como Filosofia Aristotélico-Tomista. São Tomás de Aquino escreveu a Suma teológica, na qual as questões de fé são abordadas pela “luz da razão” e a Filosofia como o instrumento que auxilia o trabalho da Teologia.


Seja na Patrística ou na Escolástica, o problema da Filosofia cristã era o de encontrar um meio para reunir as verdades da razão e as verdades da fé, isto é, reunir o que a Filosofia havia separado em sua constituição primeira: a razão e o mito. Ora, que “mitos” do Cristianismo precisam ser provados ou, ao menos, explicados racionalmente? Faz-se necessário:

1. Provar a existência de Deus e os atributos de sua essência, isto é, provar racionalmente que Deus existe e possui, por essência, os seguintes atributos: eternidade, infinitude, onisciência, onipotência, bondade, justiça e misericórdia.

2. Provar que o mundo existe e não é eterno, mas que foi criado por Deus do nada e retornará ao nada, no dia do Juízo Final; explicar racionalmente como o mundo foi criado segundo a vontade divina e é determinado pela Providência divina, através das leis da Natureza e dos milagres.

3. Provar que a ação divina pode ter efeitos materiais e finitos, como a criação do homem e do mundo, apesar da natureza de Deus ser imaterial e infinita.Tal inferência de que uma causa imaterial é infinita pode ter como efeito algo material e finito parece ser um tanto absurdo para os filósofos gregos, pois, segundo os princípios da identidade e da não contradição, uma causa deve ser, necessariamente, da mesma natureza que seu efeito. Ora, a natureza divina não é a mesma que a natureza humana ou mundana, portanto, a criação do mundo por Deus parece ser uma contradição. Se não for possível provar racionalmente a criação do mundo devemos, visto que a razão humana é limitada segundo alguns metafísicos cristãos, considerá-la como um mistério da fé.

4. Provar que não há contradição entre a liberdade humana e a onisciência-onipresença de Deus. Se Deus fez cada um dos homens e, desde sempre, determinou o que cada um deles escolherá, então o homem não é livre, mas suas escolhas já foram pré-determinadas pela vontade divina. Poderia se perguntar para quê tantas provas? Tais provas não servem senão para mostrar que fé e razão, revelação e conhecimento intelectivo não são incompatíveis e, quando o forem, a fé ou a revelação deve ser considerada superior à razão e ao intelecto, que devem se submeter a ela. Como escreveu Tomás de Aquino: “sempre que Agostinho, imbuído das doutrinas dos platonistas encontrava nos seus escritos algo consistente com a fé, adotava-o; e aquilo que era contrário à fé, corrigia-o. (Suma teológica I, 84, 5)”.


Podemos concluir que, como vimos, a problemática cristã constitui se essencialmente na relação entre fé e razão. Conhecemos verdadeiramente pela fé e pela razão juntas? Apenas pela fé? Apenas pela razão? Predominantemente pela fé ou pela razão? Segundo Verweyen, em sua obra Historia de la Filosofia Medieval, temos na Escolástica três soluções:

1. A racionalizante: a verdade é apreendida pela razão conforme a revelação divina e não a contradiz, além disso, há a inclinação em elevar ao máximo as pretensões da razão.

2. A semirracionalista: a verdade é revelada e a razão tem o papel explicativo ou até persuasivo, ou seja, trata-se de manter em posição equidistante os extremos à fé e ao saber.

3. A antirracionalista: a verdade é revelada e necessariamente crida, sem fundamentos racionais, portanto, se espera muito pouco da razão visto que a salvação do conhecimento depende da fé.

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