sexta-feira, 10 de maio de 2019

Aristóteles e o bem comum como finalidade da vida política

Ética e política possuem uma vigorosa imbricação em Aristóteles. A cidade será o local privilegiado da vida virtuosa e o político exemplar será aquele afeto à disposição da prudência. As páginas de Ética a Nicômaco serão não somente a principal referência para a compreensão de uma ética prática, segundo a qual a virtude consiste na escolha do justo meio entre dois extremos, encontrado pela prudência, educado pelo hábito, mas também serão responsáveis pela passagem da ética à política.

Essa passagem é realizada pela introdução de um conceito que parece ter sido esquecido ao longo da história da filosofia: a amizade. Já não acreditamos mais no amor desinteressado e a gasta palavra amizade, usada à exaustão por discursos maliciosos, já não comove tanto quanto no seu frescor inicial. Para os gregos, no entanto, a amizade continha ainda um sabor especial.

Os livros VIII e IX da Ética a Nicômaco a ela se dedicam, distinguindo o vício da virtude: akrasía, a incontinência, falta de domínio sobre si, e philía, amizade. Enquanto a amizade consiste na benevolência, na busca do prazer do outro, na entrega desinteressada, o vício busca obter o próprio prazer, sempre de modo imoderado e arbitrário, por vezes mascarando-se de amizade para ludibriar e conseguir uma maior vantagem. Por isso, para Aristóteles, a amizade só pode existir entre prudentes e virtuosos, entre aqueles que são semelhantes no desejo de fazer bem a outrem.

Assim entendemos o porquê da passagem da vida ética à vida política. Muito natural que os homens virtuosos e dados à amizade se unam em busca de um bem comum. A amizade será, então, ao mesmo tempo condição e consequência da vida em comunidade, "argamassa" na construção da vida justa e feliz.

A principal obra de Aristóteles no que diz respeito à Filosofia Política, no entanto, traz como título A Política. No decorrer dos livros que integram o corpo da obra, o filósofo oferece uma análise detalhada do que vem a ser a constituição de uma sociedade política e quais são as suas características.

Entre os mais relevantes princípios legados à história do pensamento político do Ocidente, encontra-se aquele segundo o qual o homem é um animal político por natureza – zóon poliktikon. Sendo um animal gregário, como as abelhas e as formigas, todo homem possui uma inclinação natural à vida em comunidade.

Há uma tendência natural no homem para a vida comunitária. Sendo carente, ele precisa da companhia dos outros homens, não somente para suprir suas necessidades básicas, mas para alcançar a completude a que aspira.

Ainda que existiam comunidades cronologicamente anteriores às cidades, tais como as famílias ou as pequenas aldeias, Aristóteles acreditava que a comunidade propriamente dita só se constitua na cidade, na comunidade política. Será a cidade constituída com a finalidade do bem comum e da vida justa o paradigma do seu programa político.

O homem precisa, então, tornar-se um cidadão. Mas note que, para Aristóteles, a palavra cidadão difere substancialmente em sentido do que entendemos atualmente pelo termo. Para o filósofo, cidadão era aquele que efetivamente participava da política, excluídos as mulheres, as crianças, os idosos, os estrangeiros e os escravos. Os direitos políticos só eram destinados a uma minoria que participava diretamente do governo, seja participando das discussões públicas, seja decidindo rumos para a condução dos negócios públicos.

A adoção de um regime de governo será definida pela quantidade de cidadãos que ocuparem o poder soberano. Se for o governo de um só cidadão, será ele a realeza. Se for de alguns, será a aristocracia. Se for de todos, será a república. A degeneração pelos vícios gera, contudo, versões corrompidas dos governos perfeitos. A realeza converte-se em tirania, a aristocracia em oligarquia, a república em democracia.

Antes de terminarmos este tópico, convém salientar um aspecto do pensamento aristotélico caro às teorias da justiça.



Independentemente de sua constituição, o estado existe para que os homens tenham condições de gozar de uma vida justa e harmoniosa. Na avaliação do estado, um critério tem proeminência: a justiça. Um estado justo, segundo Aristóteles, deve tratar os iguais com igualdade e os desiguais com desigualdade. Tratar a todos com absoluta igualdade não contempla as exigências da justiça.


Nenhum comentário:

Postar um comentário