quinta-feira, 9 de maio de 2019

Nicolau Maquiavel e o Estado forte-bacharelado

Estamos acostumados com a relação que a linguagem comum estabelece entre o adjetivo maquiavélico e o sentido que gira em torno da imagem de um homem sórdido, traiçoeiro, mesquinho. Mas aí é preciso ter um pouco de cuidado. Embora seja o nome de Maquiavel citado como a encarnação do mal, o pensador renascentista foi um notável teórico e articulador político de um cenário conturbado, no qual reviravoltas e sucessões de governos geravam tal instabilidade que impedia qualquer meio de vida protegido por um mínimo de segurança

Impressionado pelas disputas que assolavam a cidade de Florença e toda a península itálica, Maquiavel se dá conta da inutilidade em esperar de fórmulas mágicas a solução de problemas tão reais. Opondo-se radicalmente ao idealismo político, ocupado apenas com uma ordem ideal – imaginando como o mundo deveria ser – mas desatento à realidade concreta, seus esforços terão como ponto de partida e chegada a verdade extraída inteiramente dos fatos. 

Com Maquiavel, a política perde a auréola de qualidade natural ou divina, sendo substituída por uma atividade humana e racional constitutiva da existência coletiva. Daí a necessidade do planejamento de um programa político que atenda às exigências de um quadro tortuoso e complexo. E o pensador florentino o redige na sua principal obra: O príncipe.

Como vencer os auspícios da instabilidade dos governos das cidades e assegurar uma vida tranquila aos homens? Para compreender a resposta de Maquiavel, precisamos perceber como o pensador entendia a natureza humana. 

Observando os homens que o cercavam, Maquiavel conclui que a vida em comunidade nunca ocorre sem dificuldades e isto por um motivo claro: os homens são volúveis e simuladores, egoístas e ávidos de lucro. Numa sociedade fragilizada, a luta pelo poder pode ser interminável. Somente um governo centralizado e forte pode garantir a estabilidade de uma comunidade humana.

Maquiavel não recusa inteiramente que o governo de uma cidade seja organizado sob a forma de uma república, desde que o povo dessa cidade seja suficientemente virtuoso para tanto, o que é raro. O governo de um único príncipe parece ser sempre melhor: este é o Estado forte, mais unido e menos sujeito à corrupção, capaz de gerir os bens públicos, mais resistente contra as invasões estrangeiras.



Quem é o príncipe? Quais suas qualidades indispensáveis? O príncipe é o homem virtuoso que se mantém no poder pelo sábio uso da força. Enquanto nas sociedades desorganizadas politicamente o mais forte apenas conquista, não persevera no poder, o príncipe, guiado pela necessidade, sabe se utilizar dos recursos disponíveis e salvar o Estado das investidas inimigas.

Para Maquiavel, o príncipe não precisa ser bom, comportar- -se segundo as regras da moralidade, nem precisa ser amado pelos seus súditos – basta possuir a sabedoria de agir conforme as circunstâncias e o respeito dos governados, saber resistir aos inimigos e assegurar a manutenção do Estado, baluarte da ordem e da paz. Esta é a finalidade da política.

Os meios para o triunfo das dificuldades e manutenção do Estado nunca deixarão de ser julgados honrosos. Segundo o pensador florentino, deve o governante usar da inteligência e ao mesmo tempo aprender dos animais: deve o príncipe ser um leão e uma raposa.


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